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terça-feira, 15 de maio de 2012

NO BALANÇO DA DELTA - Dono da Delta Construções embolsou R$ 64 milhões


Balanço de 2011 mostra queda no faturamento, mas Cavendish fez maior retirada de lucro

O GLOBO

RIO - A Delta Construções, envolvida em denúncias de fraude e corrupção, teve queda no faturamento no ano passado, mas os acionistas não têm do que reclamar. Enquanto o faturamento caiu 10,3% em 2011, para R$ 2,8 bilhões, e o lucro líquido tombou 85,4%, para R$ 32 milhões, os sócios receberam a maior bolada desde pelo menos 2008. Fernando Cavendish, principal dono e ex-presidente do conselho de administração, e outros acionistas embolsaram em 2011 nada menos que R$ 64,6 milhões em dividendos, a parcela dos lucros acumulados da empresa retirada pelos sócios. O balanço refere-se ao exercício do ano passado, quando já estava em curso a Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, iniciada em novembro de 2010. A empreiteira era a líder das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Os dividendos pagos pela empreiteira cresceram 1.182,5% em comparação com 2009, ano mais lucrativo da Delta, quando os dividendos pagos aos acionistas somaram cerca de R$ 5 milhões.

A Delta só divulgou nesta segunda-feira no “Jornal Corporativo” os demonstrativos contábeis do ano passado, mais de uma semana depois da venda da empresa para o grupo J&F, dos irmãos José, Joesley e Wesley Batista. Responsáveis pela auditoria independente, os contadores Mário Vieira Lopes e Sheila Conrado, da BKR Lopes Machado Auditores, aprovaram o balanço com ressalva.

Alegaram não ter como “quantificar” possíveis consequências da Operação Monte Carlo. “Em função do atual status em que se encontram estes trabalhos, estamos impossibilitados de quantificar os possíveis ajustes que poderão impactar as demonstrações contábeis da companhia”, dizem Mário e Sheila no parecer publicado.

Sequer garantem que os números divulgados não estão fraudados — referência feita pelos próprios no parecer: “No atual status em que se encontram as investigações, não podemos afirmar que as demonstrações contábeis apresentam distorções relevantes decorrentes de fraude”.

Na opinião de auditores consultados pelo GLOBO, foram menosprezados possíveis prejuízos pela perda de contratos com órgãos públicos. Isso pode acontecer se a empresa for declarada inidônea pela Controladoria Geral da União (CGU). A empresa informou ter R$ 966,2 milhões a receber de clientes ao fim de 2011, mas só 8,3% foram considerados em risco de inadimplência. Esse possível prejuízo motivou uma reserva, chamada no balanço de “provisão para créditos de liquidação duvidosa”, de R$ 79,9 milhões e foi a principal razão para a queda no lucro contábil da empresa.

— Achei pequena a provisão pelo tamanho da conta a receber, considerando o nível de exposição da empresa. Pode não ser suficiente — disse uma auditora que examinou o balanço da empresa sob condição de anonimato.

Ao fazer uma provisão, a empresa reconhece que vai precisar de determinado valor para uma possível despesa no futuro. Além da reserva para “créditos de liquidação duvidosa”, a Delta fez provisão para eventuais indenizações em processos judiciais. Em 31 de dezembro do ano passado, a Delta tinha R$ 21,5 milhões reservados para condenações, risco calculado pelos advogados.

Na semana passada, a construtora passou à gestão da J&F, controladora do frigorífico JBS, por assinatura de um contrato de intenção de venda. O valor da transação será determinado após conclusão de auditoria da KPMG e vai ser pago com dividendos recolhidos durante o período de administração dos donos do JBS.

No balanço recém-divulgado, a Delta informa ter um patrimônio líquido de R$ 1,074 bilhão e R$ 309 milhões em caixa. Mas a dívida em empréstimos da empreiteira soma R$ 314 milhões. Dessa dívida, pelo menos R$ 99,7 milhões vieram de recursos do Banco Nacional de Denvolvimento Econômico e Social (BNDES), por meio do Finame, linha de financiamento operada por outros bancos.

Auditores consideraram que, ao fim de 2011, a empresa já apresentava “comprometimento de liquidez”. Isso porque a operação da construtora — entre obras, aluguel de carros e outros serviços prestados — gerou R$ 168,5 milhões em caixa ano passado. Mas o desdobramento das investigações pode causar a perda de contratos pela empreiteira, que já abandonou obras como a adaptação do estádio Maracanã para a Copa de 2014 e a Transcarioca. Procurada, a Delta não quis se manifestar.


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