Ambulâncias avançadas atendem apenas uma em cada quatro vítimas graves
Flávia Junqueira e Thamyres Dias
Extra
Uma chuva fina caía durante o cortejo fúnebre. Cerca de 60 pessoas acompanhavam o caixão de madeira clara até a cova 60.042 do Cemitério de Irajá, na despedida ao mestre de obras que ajudou a erguer Brasília e, aos 77 anos, se preparava para o terceiro casamento. Muitos ainda comentavam a demora no socorro, a frustração da esperança de que tudo acabaria bem ao verem a ambulância do Samu levando Waldyr Gomes dos Santos para o hospital, a morte inesperada. Assim foi o desfecho do primeiro atendimento realizado pela viatura SB-148, do quartel dos bombeiros da Penha, no último dia 14 de maio.
A ambulância básica — tripulada por dois técnicos de enfermagem, munidos apenas de soro, oxigênio e muita disposição para realizar massagem cardíaca — chegou com Waldyr ao Hospital Getúlio Vargas uma hora e 18 minutos após o vizinho José Glicério Batista ter tentando, pela primeira vez, ligar para o 192. Sem recursos como adrenalina e respirador durante o trajeto — exclusivos de ambulâncias avançadas, com médico — o paciente deu entrada morto na emergência. Para os socorristas, foi frustrante. Para a família, uma tragédia. Para o Corpo de Bombeiros, que opera o Samu desde 2009, uma constatação: dos 1.161 atendimentos que envolviam risco de vida — os eventos vermelhos — no ano passado, apenas 302 (26%) foram realizados por ambulâncias avançadas, como determina o Manual Técnico da Regulação Médica das Urgências, do Ministério da Saúde.
Em toda a cidade do Rio, há apenas dez ambulâncias desse tipo — sendo que duas são destinadas a transferências inter-hospitalares e outras duas a salvamentos nas praias. Uma viatura para cada 630 mil habitantes. As demais 67 que rodam na cidade são tripuladas por profissionais de enfermagem, que se desdobram para salvar vidas com os recursos que têm e sofrem quando, diante de casos graves como o de Waldyr, se veem impotentes.
— Não deu — desabafou o bombeiro, cabisbaixo.
A história de Waldyr e de outras 14 pessoas ilustram a série "S.O.Samu", que o EXTRA começa a publicar neste domingo, após entrevistar 37 equipes e acompanhar 23 socorros em 17 plantões feitos durante dois meses e meio.
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