Merval Pereira, O Globo
Antes mesmo de começar, o julgamento do mensalão já suscita crises políticas e polêmicas jurídicas. Se, como tudo indica, ele começar a partir do dia 1 de agosto, uma quarta-feira, ou no dia 6, uma segunda-feira, estaremos às vésperas do início da propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV — no dia 21 de agosto.
E provavelmente o julgamento estará chegando ao final perto do dia da eleição para prefeitos e vereadores, 7 de outubro, daí a preocupação de Lula.
Isso quer dizer que, com todo o atraso já verificado, principalmente devido ao fato de que o ministro Ricardo Lewandowski ainda não entregou seu voto de revisor, os eventuais efeitos políticos do julgamento não serão evitados.
Lula e seus seguidores não estão seguros de qual será o resultado e gostariam que fosse anunciado somente depois que as urnas tivessem sido fechadas.
Mas, se ao contrário do que teme o PT, os mensaleiros forem absolvidos, esse certamente será um mote da propaganda petista com bastante apelo eleitoral.
Dependendo das penas que eventualmente receberem, 22 dos 38 réus do mensalão — entre eles o ex-ministro José Dirceu — poderão terminar o julgamento com a prescrição do crime de formação de quadrilha, o que equivale a uma absolvição.
De acordo com especialistas, especificamente para o crime de quadrilha, a prescrição se dá em oito anos, mas só se o máximo da pena for superior a dois anos (a pena máxima para esse tipo de crime é de três anos).
A prescrição pode vir a ocorrer em quatro anos se os réus, ao final do processo, forem condenados a menos de dois anos no crime de formação de quadrilha.
Como o recebimento da denúncia foi em 28 de agosto de 2007, ela já teria ocorrido no ano passado. A interpretação mais acatada é que o prazo para a prescrição do crime de formação de quadrilha é contado a partir do recebimento do processo no STF.
Outra interpretação, embora menos provável de ser adotada, é de que o momento em que cessou a associação teria acontecido em 2005, quando o então deputado Roberto Jefferson denunciou a existência do mensalão.
Se a condenação for superior a dois anos, a prescrição ocorrerá em 2015. E, mesmo na interpretação menos provável, a prescrição seria em agosto de 2013.
Com o calendário fixado em três dias da semana dedicados na parte da tarde ao mensalão — segundas, quartas e quintas —, o julgamento deverá entrar por setembro, o que fará com que o ministro Cezar Peluso tenha que se aposentar antes de seu final.
Se a proposta do presidente Ayres Britto, de fazer sessões diárias para julgar o processo, pela manhã e à tarde, tivesse vingado, esse contratempo seria evitado.
Será preciso saber se o ministro Peluso apresentará seu voto antes de se aposentar, no início de setembro. Caso não o faça, o julgamento poderá continuar com os dez juízes restantes, sem que seja necessário substituí-lo.
Pode ser, no entanto, que a maioria considere imprescindível que o plenário esteja completo para que o julgamento continue, e, nesse caso, será preciso esperar a decisão da presidente Dilma sobre o novo ministro para retomar o julgamento.
O novo ministro, por sua vez, poderá pedir vista do processo para se inteirar dele a fim de proferir seu voto, o que garantirá que o julgamento entre por 2013.
A maioria do Supremo não quer dar ao julgamento do mensalão um caráter excepcional e por isso não aceitou cortar o recesso de julho para ganhar tempo, e da mesma maneira deve entender que o julgamento pode prosseguir sem a necessidade de um novo ministro ser indicado.
O número par pode provocar novamente situações constrangedoras como os empates acontecidos em alguns casos, mas há também a possibilidade de que o ministro Dias Toffoli se considere impedido de participar do julgamento por já ter sido advogado do PT.
Nesse caso, o julgamento entrará por setembro com nove ministros no plenário do STF. A pressão do ex-presidente Lula para adiar o julgamento a fim de que o anúncio do resultado não coincida com as eleições municipais, cujo primeiro turno é no dia 7 de outubro, também ajudou a que esse detalhe político fosse considerado irrelevante pela maioria do Supremo, que procura dar ao julgamento o ar de normalidade.
Alguns mensaleiros estão interessados diretamente no atraso do julgamento também para poderem concorrer às eleições municipais, como o deputado João Paulo Cunha, que pretende se candidatar a prefeito de Osasco.
Se for condenado no processo do mensalão, ficará impedido de concorrer, enquadrado na Lei da Ficha Limpa, que proíbe a candidatura de políticos condenados por colegiado.
Ele já conseguiu uma vantagem, pois o registro da candidatura precisa ser feito até o dia 5 de julho e é concedido de acordo com a situação do político naquela data.
Mas, ainda assim, Cunha correrá riscos, pois há interpretações de que, condenado no processo do mensalão, ele não poderá tomar posse mesmo se eleito.
Tudo indica que a Assembleia-Geral da OEA em Cochabamba não aprovará a proposta do Equador, que é apoiada por diversos outros países “bolivarianos” como Bolívia e Nicarágua, de reduzir a autonomia da Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
Apesar do discurso agressivo do presidente equatoriano, Rafael Correa, ontem, acusando a CIDH de ser dominada por ONGs e grupos econômicos ligados aos interesses dos Estados Unidos, o movimento para contê-la não tem a simpatia da maioria dos países, e a comissão continuará cumprindo seu papel de advertir contra os abusos dos direitos humanos e a falta de liberdade de expressão.
Como não deve haver uma disputa acirrada, o governo brasileiro ficará dispensado de explicitar sua posição, que tendia para o apoio aos países “bolivarianos”.
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