É muito comum observar especialistas em educação a fixar em duas décadas o prazo suficiente para se reverter os indicadores negativos da educação brasileira.
A se considerar o desempenho nacional do setor nos anos 2000, conforme avaliação da Unesco, só o fator tempo não será o bastante para que possamos romper o baixo padrão de qualidade do nosso sistema de ensino.
O Brasil tem um líder carismático incontestável, reconhecido como estadista internacionalmente por obedecer aos mandamentos da democracia.
No plano econômico, conseguiu obter status de potência de média importância, podendo chegar ao quinto PIB mundial. No que se refere à grande demanda contemporânea de práticas sustentáveis se situa na vanguarda do planeta verde. Pelo menos esse é o balanço oficial.
Temos adquirido habilidades tecnológicas fantásticas em diversos setores, a exemplo da exploração das imensas reservas de petróleo do pré-sal. Apesar dessas extraordinárias vantagens, nos falta competência histórica para oferecer educação de qualidade.
O déficit educacional brasileiro não é apenas um óbice para a realização do país do futuro, como muitos projetam. São atuais e altamente comprometedores os problemas de mão-de-obra qualificada que o País enfrenta em diversos setores, como o da mineração, da metalurgia, de informática, entre outros.
Por conta das inúmeras oportunidades perdidas de implementar um sistema educacional decente, continuamos a apresentar índices de atraso que superam até mesmo os países mais pobres da América Latina, que temos a honra de liderar no plano geopolítico.
O Relatório de Monitoramento Global da Educação para Todos 2010 da Unesco mostra essa realidade com muita clareza. Vamos aos números: o Brasil possui o maior índice de repetência no ensino fundamental em relação a todos os países da América Latina.
Quando é aferido o percentual de alunos que completam esse ciclo de estudos, perdemos para países muito mais pobres que o Brasil como a Bolívia, o Peru, a Venezuela e o Uruguai.
Para medir o cumprimento das seis metas estabelecidas para o setor em 2000, a Unesco criou o Índice de Desenvolvimento da Educação para Todos. A escala vai de zero a 1.
O Brasil recebeu no relatório de 2010 uma avaliação de 0,883. Em relação à America Latina está à frente somente de Nicarágua, Guatemala, República Domincana, El Salvador e Suriname. Perdemos até para Honduras do bananeiro Manuel Zelaya.
Na América Latina, quatro países já conseguiram obter o índice que confere a posição de ter atingido a meta de prover educação para todos. Outros cinco estão muito próximos, inclusive a problemática Venezuela. Já o Brasil se situa em situação intermediária, na companhia indesejável de outros 16 países.
No plano global, estamos na 88ª posição entre 128 países avaliados. Para ficar na linguagem presidencial, se fosse o Brasileirão, não seria rebaixado, mas estaria distante do título.
A Unesco reconhece que o Brasil tem obtido avanço no programa de alfabetização, na inclusão ao ensino fundamental e na paridade de acesso na questão de gênero. Mas o País é reprovado quando é medido o essencial, ou seja, a qualidade do ensino.
Outro detalhe importante é o fato de a Unesco elogiar o nosso sistema de financiamento, especialmente o Fundeb. Aqui merece uma constatação importante ao se ler o relatório da Unesco. A nossa taxa de investimentos no setor educacional em relação ao PIB é a maior da América do Sul.
Há aí uma disparidade muito grande do nosso caso, se comparado com o Chile, por exemplo, entre o percentual investido e os resultados apresentados, o que nos faz inferir que além dos problemas didáticos, estritamente atinentes ao professor e ao aluno, o sistema educacional brasileiro padece de deficiências estruturais de gestão.
O relatório da Unesco não menciona, mas é preciso destacar a maneira despudorada como administradores locais mancomunados com burocratas roubam dinheiro até de merenda escolar.
O que poderia ser feito em 20 anos vai sendo adiado sine die em função do erro essencial do modelo de educação administrado. Enquanto o Brasil não se definir pela universalização da Escola em Tempo Integral, o sistema educacional vai continuar a formar analfabetos funcionais de alto custo financeiro.
Estamos a desperdiçar tempo e dinheiro, além de pôr em dúvida a real capacidade de nos convertermos em um protagonista global confiável, já que não se pode levar a sério uma nação com indicadores educacionais piores do que a Bolívia.
Demóstenes Torres é procurador de Justiça e senador (DEM-GO)
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