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terça-feira, 2 de março de 2010

Em audiência no Senado, Jobim nega que seja contra criação da Comissão da Verdade

GABRIELA GUERREIRO
da Folha Online, em Brasília
O ministro Nelson Jobim (Defesa) negou nesta terça-feira que seja contrário à criação da Comissão da Verdade para investigar crimes políticos cometidos durante o regime militar (1946-1985).
Jobim confirmou, porém, que apresentou sua demissão aos comandantes militares no final do ano passado depois que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva editou o Plano Nacional de Direitos Humanos com a criação da comissão para investigar somente crimes cometidos pela repressão política (militares) durante a ditadura.
O ministro disse que, como havia se comprometido com os comandantes das Forças Armadas a estender as investigações da comissão também aos militantes de esquerda, não tinha condições políticas de se manter no cargo --já não teria autoridade sobre os seus comandados já que havia se comprometido a mudar o decreto que criou o plano.
"Na relação com os militares não há meio termo. Ou afirma uma coisa, ou nega. Não dá para ficar em cima do muro. [...] Eu não teria mais nenhuma autoridade sobre os militares", afirmou.
Em audiência na Comissão de Relações Exteriores do Senado, Jobim revelou que não chegou a apresentar sua demissão ao presidente Lula porque o petista aceitou sua sugestão de mudanças ao decreto que criou o plano. Mas admitiu que divergiu do ministro Paulo Vannuchi (Direitos Humanos), que era favorável à investigação dos crimes cometidos por militares no período da ditadura.
Jobim negou, porém, que tenha feito oposição à simples criação da Comissão da Verdade. "Em momento algum o ministro da Defesa se opôs à criação da comissão da verdade. A divergência entre o secretário de Direitos Humanos e o ministro estava sobre o objeto da comissão. O objeto pretendido pelo ministro Vannuchi era restrito [aos militares], que ficou expresso no texto do decreto que aprovou o Plano de Direitos Humanos, que falava em examinar violações de Direitos Humanos praticadas no contexto da repressão política", afirmou.
Após a conversa com Lula, o presidente editou um novo decreto que cria a comissão para "examinar a violação dos Direitos Humanos praticados no período fixado", sem deixar apenas os militares no foco das investigações.
Jobim disse que, como o Congresso Nacional vai discutir o projeto que cria a Comissão da Verdade, terá autonomia para manter o entendimento dos militares ou não. Mas criticou a possibilidade de o Legislativo modificar a Lei da Anistia, criada em meio ao processo de redemocratização do país.
"Se a bilateralidade [investigar militares e esquerdistas] deve ou não ser mantida, isso é questão que deve ser definida pelo Senado. O direito à memória não é afastável, o que não se pode é querer rever o acordo político de 1979 que deu possibilidade à transição política do país. Não temos o direito de deixar ser desfeito o que foi feito. Quem foi anistiado, foi anistiado. Não pode ser desanistiado."
Depois de apresentar sua demissão aos ministros, Jobim disse que se reuniria com a cúpula das Forças Armadas para formalizar a decisão. O ministro mudou de ideia após a conversa com Lula e, durante reunião com a alta cúpula militar, anunciou a mudança no texto, o que lhe permitiu ficar no cargo.
Acordo
Na nova versão, Lula estabeleceu que a Comissão da Verdade vai investigar crimes contra os direitos humanos praticados no período --sejam eles por militares ou militantes de esquerda. O decreto criou um grupo de trabalho para elaborar, até abril deste ano, um anteprojeto de lei que cria a Comissão Nacional da Verdade.
Depois que o grupo de trabalho elaborar o anteprojeto de lei, o governo terá que enviá-lo para o Congresso, que precisa aprovar o texto para que a Comissão da Verdade seja efetivamente criada.
Além dos militares, a Igreja Católica e setores do agronegócio também reagiram à criação do programa. A igreja critica pontos como a descriminalização do aborto e ao casamento entre pessoas do mesmo sexo. A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) também classificou de "intolerante" a sugestão do programa de "impedir a ostentação de símbolos religiosos em estabelecimentos públicos da União".
A CNA (Confederação Nacional da Agricultura), presidida por Kátia Abreu, criticou itens do programa referentes ao agronegócio --especialmente o trecho que menciona violações de direitos humanos por grandes agricultores brasileiros.

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