Delegado aposentado diz que alertou Arruda para irregularidades no GDF e admite que o governador sabia das investigações em andamento
Ana Maria Campos
Publicação: 06/03/2010 09:22 Atualização: 06/03/2010 13:11
Ana Maria Campos
Publicação: 06/03/2010 09:22 Atualização: 06/03/2010 13:11
"Nenhum chefe de Executivo no Brasil inteiro fica sem saber de uma investigação sensível que a polícia vai fazer" |
Ferro conta nesta entrevista ao Correio que Arruda soube, por exemplo, dois dias antes da Operação Aquarela, ocorrida em 2007, o nome de todos os investigados que seriam presos, como o ex-presidente do Banco de Brasília (BRB) Tarcísio Franklim, aliado do ex-governador Joaquim Roriz, e Juarez Cançado, então secretário-geral da Associação Nacional dos Bancos (Asbace). O delegado aposentado revela que, durante o tempo em que comandou o Depate (Departamento de Atividades Especiais), até março de 2009, alertava Arruda sobre irregularidades no GDF, numa espécie de trabalho de inteligência de Estado. Chegou a aconselhá-lo a se afastar de Durval Barbosa. Depois de aposentado, auxiliou Arruda em trabalhos de consultoria na área de inteligência.
Em depoimento ao MP, na semana passada, Ferro conta ter tomado conhecimento de uma reunião convocada por Arruda com a cúpula da área de segurança, em meados de 2009, em que teria reclamado de não ter informações sobre uma investigação envolvendo o policial civil aposentado Marcelo Toledo em crimes de lavagem de dinheiro. Toledo é investigado na Operação Caixa de Pandora por ter sido filmado entregando dinheiro a Omézio Pontes, o ex-assessor de imprensa de Arruda.
Por que o senhor decidiu prestar depoimento ao Ministério Público?
Gostaria de rebater o que a subprocuradora disse, que a prisão do Arruda encorajou delegados (a denunciar interferência). É mentira dela. Fui espontaneamente ao Ministério Público. E outra coisa: não tem interferência de chefe do Executivo em fatos e investigações feitas pela polícia, ele tem conhecimento de forma antecipada. Nenhum chefe de Executivo no Brasil inteiro fica sem saber de uma investigação sensível que a polícia vai fazer. A Polícia Federal não faz uma investigação sem o ministro da Justiça saber, envolvendo políticos, governantes. Acontece isso no Brasil todo.
Mas e se o investigado for o próprio ministro da Justiça?
Se a polícia não souber que o ministro da Justiça está envolvido, vai dizer: tem uma investigação assim. Por exemplo, a Operação Aquarela. O governador Arruda sabia dois dias antes todo mundo que ia ser preso. Não teve problema nenhum.
O governador sabia das escutas, dos dados sigilosos da Operação Aquarela?
Ele não fica sabendo de detalhes da investigação. Mas, de maneira geral, sabe o que acontece. Lógico que não se leva um CD para o governador ouvir. Está protegido sob sigilo. Mas ele é o chefe da Polícia.
É verdade que na Aquarela o grupo rorizista reclamou que o senhor não avisou da escuta de Roriz?
Lógico, mas tenho culpa se o Roriz caiu conversando no telefone? Não tenho culpa, porque Roriz sabia daquela investigação. Começou no governo dele. Eles têm raiva mesmo de mim porque não passei nada para eles. Mas sou um profissional, não posso fazer esse tipo de coisa.
O senhor não passou porque espeitou o trabalho da Polícia?
Exatamente. Se ele fosse um governador atuante, eu falaria para ele. Entendeu? Então não existe essa interferência do chefe do Executivo porque o governador fica sabendo das investigações.
Como funciona o seu trabalho de consultoria?
O governador sabia que sou uma pessoa da área de inteligência muito respeitada. Ele me chamou e disse: “Celso, quero que você sempre me avise de problemas no meu governo. Faça inteligência de Estado”. Eu falei para ele diversas vezes para demitir o Durval Barbosa. Ele sabia dos problemas. Estava sendo chantageado.
Quando o senhor disse pela primeira vez?
Logo no início do governo. Político tem comprometimento, eu não entendo.
O senhor sabia que o Durval gravava as pessoas?
Não vou entrar no mérito dessa questão. Mas sempre alertei o governador sobre irregularidades. Sempre tive uma relação muito próxima com o governador. E teve muitas coisas que ele tomou decisão em licitações que seriam superfaturadas e mandava cancelar. Aqueles pontos do relatório, ele já sabia. Aquela investigação do Pró-DF, o governador sabia. O Paulo Octávio sabia. Um governante recebe muita informação. Quando saí da polícia, ele me convidou para consultoria e ajudar no projeto de reeleição. Eu fiz uma proposta, mas ele não aceitou. Mesmo assim, continuei alertando sobre problemas. E ele me colocou em contato com o Domingos Lamoglia. Aquele relatório, escrevi de punho.
O senhor sabia que havia tantos problemas, como pagamento de deputados?
Não. Ele (Arruda) sempre se mostrou um governante muito sério. Ele sempre tomava providências quanto às irregularidades. E eu sempre fiz o meu trabalho. Na Operação Tucunaré, eu que determinei a instauração de inquérito e na Tellus, também. Quero deixar claro que essas investigações não são de responsabilidade do Ministério Público e sim da Polícia Civil.
Cícero Jairo, diretor do Depate, caiu porque não informou
ao governador sobre investigações?
Não. Isso é ilação, dedução.
Como é que o senhor desenvolve esse trabalho de inteligência?
Como é que eu vou te explicar? São 20 anos de experiência. É um trabalho profissional.
O senhor nunca recebeu pagamento do Arruda?
Não. Se ele tivesse me pagado, poderia ter feito muito mais.
O que Arruda deveria ter feito para evitar essa crise?
Não sei. Teria de pensar.
Se o senhor responder, seria uma consultoria de graça, né?
Isso.
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