Não conheço missão maior e mais nobre que a de dirigir as inteligências jovens e preparar os homens do futuro disse Dom Pedro II

domingo, 21 de outubro de 2012

CORRUPÇÃO - Corruptos somam apenas 0,12% do total de presos no Brasil

Seja pagando ou recebendo propina são poucos os casos de corrupção entre a população carcerária

O GLOBO

Manifestantes em Natal (RN) pedem punição de vereadores condenados por “vender” Plano Diretor, após a Operação Impacto, do MPDN/D.A PRESS/5-9-2011


Se mandar para a cadeia os 19 réus do mensalão condenados pelos crimes de corrupção ativa ou passiva, o Supremo Tribunal Federal (STF) altera um paradigma do sistema penal brasileiro. Hoje, a regra é não pôr corruptos atrás das grades. Apenas 632 pessoas (0,12% de uma população carcerária de 514 mil presos), segundo o último levantamento do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), estavam presas em dezembro de 2011 porque agiram contra a administração pública, seja corrompendo agentes do Estado ou valendo-se do cargo de servidor para achacar contribuintes.

As prisões estritamente ligadas à corrupção, entretanto, podem ser em número ainda menor. De modo geral, os corruptos estão encarcerados porque também mataram ou formaram bando armado, prática associada às milicias e aos bandidos infiltrados na polícia. Não é por acaso que em São Paulo, de acordo com a Secretaria Estadual de Assuntos Penitenciários, nenhum dos 164.633 hoje detentos está na cadeia devido a condenações pelos artigos 333 e 317 do Código Penal. No Rio, as estatísticas do Depen indicam que não há presos por corrupção passiva. Já 123 corruptores (corrupção ativa) estavam presos no fim do ano passado.

O Direito brasileiro, afirmam promotores, juristas e magistrados ouvidos pelo GLOBO, consagrou que o corrupto não oferece elevado risco à sociedade. De modo geral, a pena de reclusão é revertida em pena privativa de direitos, como prestação de serviços à comunidade, perda de cargo público ou mesmo de mandato eletivo. Mas há exceções. E não necessariamente aplicadas a autores de crimes de colarinho branco.

Caso raro de quem pegou cadeia, de fato, por corrupção passiva em São Paulo é o de Sônia Aguiar Oliveira, funcionária da Circunscrição Regional de Trânsito (Ciretran) em Capão Bonito, no interior de São Paulo, que pediu R$ 200 para desbloquear a CNH de Milton Gonçalves, em 2007. De acordo com o processo, como ele disse que não tinha este valor, ela pediu um porco de presente para resolver o problema. Recebeu. Foi condenada a quatro anos de reclusão no regime inicial fechado, convertidos em três anos em regime semiaberto. Ela acabou de cumprir a pena e atribui a condenação a uma perseguição do delegado que era chefe em sua seção.

— Era época de fim de ano. Como tínhamos certa intimidade, ele trouxe esse brinde para a gente fazer um churrasco. Todo setor público tem isso. Foi uma coisa muito ridícula — diz Sônia, que perdeu o cargo e passou pelo menos um ano e dois meses detida na carceragem do 33º Distrito Policial de Pirituba, em São Paulo.

Ela acredita só ter ficado presa porque também havia sido acusada de outros crimes em outras situações, entre eles o de peculato. Depois do episódio, formou-se como técnica em enfermagem.

Enquanto isso, em Natal (RN), 16 vereadores, ex-vereadores, servidores públicos e empresários foram condenados em janeiro deste ano por comercializarem o Plano Diretor da capital potiguar, em 2007, mas não passaram um dia atrás das grades. O Ministério Público convenceu o juiz Raimundo de Oliveira Costa de que os parlamentares aceitavam propina tabelada de aproximadamente R$ 30 mil. Classificados pelo MP-RN como os mentores da organização, os ex-vereadores Dickson Ricardo Nasser dos Santos e Emilson Medeiros dos Santos receberam pena de sete anos e nove meses de reclusão em primeira instância pelo crime de corrupção e aguardam, em liberdade, julgamento de recurso no Tribunal de Justiça. O pedido de prisão preventiva foi indeferido pelo magistrado.

— Não passaram sequer uma noite na cadeia. Hoje, a gente quer a condenação por tribunal colegiado para assegurar, ao menos, que sejam incluídos na Lei da Ficha Limpa. Na minha experiência de dez anos de Promotoria do Patrimônio Público, afirmo que o agente corrupto receia mesmo é a prisão. A prisão exerce a função de prevenção geral. A pena pecuniária (que implica perda de dinheiro) não aterroriza — diz o promotor Afonso de Ligório, que participou da Operação Impacto, que desbaratou o esquema.

O advogado Adriano Silva Dantas, que defendeu Nasser em primeira instância, confirmou que não houve prisões, mas não quis comentar a ação porque deixou o caso. Flaviano da Gama Fernandes, que responde agora pela defesa de ambos, não foi encontrado.

A inexistência de prisão para o crime de corrupção é tão evidente que, caso sejam encarcerados, os réus do mensalão poderiam, em tese, alterar as estatísticas do sistema prisional. Supondo que os dez réus condenados por corrupção passiva sejam presos, a população de detentos condenados pelo artigo 317 do Código Penal crescerá em um sexto. Isso porque apenas 55 homens e duas mulheres estão atrás das grades em todo o país, de acordo com a última contabilização do Depen.

A conversão das penas de reclusão por prestação de serviços à comunidade é a regra. Foi assim há três semanas, quando os desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo analisaram recurso impetrado por Aparecido Queiroz, condenado a dois anos de reclusão por cobrar R$ 250 para agilizar um exame de paternidade em São José do Rio Preto, em São Paulo. O mesmo ocorreu com Edson Gomes, funcionário do setor de pessoal da prefeitura de Ubatuba, que cobrou R$ 2,1 mil da viúva de um ex-funcionário da prefeitura que o procurou a fim de providenciar o recebimento de prêmio de seguro em razão do falecimento do marido.

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