Delta: dinheiro de lavagem compensaria menor preço
Por João Bosco Rabello
Estadão
Setores do governo e do Judiciário defendem o aprofundamento das investigações que materializem a desconfiança sobre a relação entre o dinheiro de Carlos Cachoeira na Delta e os preços competitivos que garantiu vitórias para a empresa em licitações públicas.
Trocada em miúdos, a ideia é provar o que para muitos é certeza: ao lavar dinheiro dos negócios ilegais de cachoeira, a construtora ganhava lastro para compensar os preços baixos nas concorrências e conquistar obras oficiais de vulto.
Sustentável ou não, a simples desconfiança é outro elemento para tornar, mais que imprópria, cínica, a pretensão de limitar as investigações sobre a construtora aos seus negócios no Centro-Oeste. A frustração dessa tentativa anunciada virá a ser um dos primeiros sinais mais claros sobre a improbabilidade de controle político da CPI pelo seu proponente.
Mais provável é que a ideia seja uma das muitas iniciativas em curso voltadas para interesses individuais de parlamentares que veem na CPI a oportunidade para exterminar politicamente adversários históricos. O que já ocorre em parte com a farta distribuição de grampos que banaliza a escuta telefônica como método investigativo complementar, para tornar-se instrumento principal das operações policiais.
A CPI do Cachoeira começa por onde as outras terminaram, ou seja, poupando seus integrantes da fase investigativa, com provas produzidas e relatórios policiais conclusivos em alguns casos. O que impõe aos parlamentares o dever seletivo de convocações e objetividade nas suas ações.
O foco na Delta certamente desvendará uma teia de relações promíscuas de políticos e partidos com o submundo do crime organizado, a partir de Cachoeira, dando dimensão concreta ao discurso do “doa a quem doer”, até aqui aparentemente mera peça retórica de quem julga possível condenações seletivas segundo um mapa político previamente traçado.
Nesse momento, sequer ainda nas preliminares, a CPI já sabe, por exemplo, que governadores como Agnelo Queiroz (PT-DF), Sérgio Cabral (PMDB-RJ) e Marconi Perillo (PSDB-GO) – nessa ordem e ressalvados os respectivos graus de delito – estão em maus lençóis e com suas carreiras políticas seriamente ameaçadas.
Ou seja, antes mesmo de entrar em pleno funcionamento, a CPI já tem no banco dos réus governadores do PT, PSDB e PMDB. Promete doer ainda em um universo mais amplo, constatação que talvez explique a tentativa de setores partidários, principalmente do PT, de levar ao palco também a mídia – principal obstáculo à estratégia de controle das informações comprometedoras.
Além, claro, da Constituição, que garante o sigilo das fontes, sem especificar quais, e de legislação complementar que a reforça proibindo à autoridade pública impor sua quebra àqueles cujas atividades impliquem a guarda do segredo profissional. Rol em que estão jornalistas, médicos, advogados e outros.
A investigação profunda da Delta importa também ao mercado, ainda que como efeito colateral, para avaliar minimamente os danos comerciais de empresas concorrentes com o cartel criminoso da empresa, que vai da construção civil à locação de veículos, passando por coleta de lixo e venda de sistemas tecnológicos.
Tudo isso com dinheiro público federal e estadual.
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