Parlamentares aumentaram em 53% as despesas com verba de ressarcimento no fim do ano. Dinheiro foi usado em pacotes de viagens e pagamento de “boca-livre” para aliados em restaurantes
Publicado em 20/02/2011 | SANDRO MOSER E ROSANA FÉLIX
Com o dinheiro gasto pelos parlamentares em dezembro, seria possível comprar 5 mil cestas básicas, por exemplo. Isso mostra que, mesmo com o recesso de quase duas semanas – a Assembleia fechou as portas em 17 de dezembro, e funcionou por apenas 12 dias úteis – os deputados não economizaram nas despesas.
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Assessores ficaram em hotel de luxo
A verba indenizatória da Assembleia Legislativa do Paraná foi usada para pagar a hospedagem de três assessores do deputado Luiz Claudio Romanelli (PMDB), atual secretário estadual do Trabalho, em um hotel de luxo em Foz do Iguaçu. No mês de dezembro do ano passado, o peemedebista apresentou gastos relacionados sob a rubrica de “despesa de hospedagem e estadia” de R$ 4.728,45.
Gastança é afronta ao direito
O esforço dos deputados em gastar até o limite a verba anual de ressarcimento afronta os princípios do direito administrativo e mostra uma inversão da lógica por parte dos parlamentares. Os deputados acabam criando gastos nos meses finais do ano para usar até o limite o dinheiro a que têm direito. No entanto, a verba foi criada para pagar despesas estritamente necessárias para o mandato.
Alimentação
Verba paga panetone no Natal
A ex-deputada estadual Rosane Ferreira (PV), hoje na Câmara Federal, apresentou à Assembleia uma nota de R$ 3,5 mil para ressarcimento de “serviço de fornecimento de alimentação” em uma confeitaria na Cidade Industrial de Curitiba. A reportagem da Gazeta do Povo foi até o local e apurou que o gasto inclui a compra de mil panetones pela deputada. De acordo com informações prestadas por funcionários da confeitaria, uma única nota fiscal foi emitida em nome de Rosane, incluindo os gastos de lanches de alguns assessores da parlamentar e o valor dos cerca de mil panetones que foram encomendados no dia 5 de dezembro e entregues no dia 12 daquele mês.
Os confeitos foram distribuídos na semana do Natal em Araucária, reduto eleitoral de Rosane, na região metropolitana de Curitiba. A assessoria de imprensa da deputada reconhece que fez a distribuição de panetones, repetindo uma “tradição” de outros anos, mas negou que os panetones tenham sido comprados com verba de ressarcimento. Segundo a assessoria, os gastos apresentados à Assembleia se referem apenas a refeições feitas por assessores da deputada durante o ano e cobradas numa única nota fiscal.
Essa prática é bastante comum, segundo parlamentares ouvidos pela reportagem. Outros admitem que bancam, com verba da Assembleia, almoços ou jantares para aliados, em encontros políticos. Não há uma regra definida sobre os limites da verba indenizatória para alimentação.
O professor de Ciência Política e Direito Constitucional Carlos Luiz Strapazzon diz não ser possível julgar a prestação de contas dos deputados, já que a Assembleia não determinou regras detalhadas para o ressarcimento das despesas. E esse, na verdade, seria o problema. “A Assembleia deveria, por exemplo, estipular um número de refeições e o teto de gastos, como as empresas adotam. Entretanto, o Legislativo não estipula uma norma e os abusos são frequentes”, diz.
Apesar do alto valor movimentado, os parlamentares agem completamente dentro da lei. Pelas normas do Legislativo paranaense, cada gabinete tem direito a um ressarcimento de R$ 15 mil mensais, para custear gastos com combustível, alimentação, hospedagem, divulgação da atividade parlamentar, entre outros. Porém o saldo que não é usado vai acumulando para os meses seguintes, e muitos deputados aproveitam para “torrar” o dinheiro em dezembro. Os gastos com alimentação, por exemplo, atingiram uma média de R$ 136,8 mil entre janeiro e novembro. Em dezembro, essa rubrica saltou para R$ 177 mil.
Levantamento feito pela reportagem com os dados de 2009 já mostrava essa tendência. No segundo semestre daquele ano, quando a publicação dos dados começou a ser feita, as despesas médias dos 54 deputados foi de R$ 745.742 no período entre agosto e novembro. Em dezembro, no entanto, essa quantia subiu para R$ 982.631,71.
Os deputados argumentam que gastam mais no fim do ano porque quitam as dívidas acumuladas nos meses anteriores. Entretanto, os dados tabulados pela Gazeta do Povo mostram que os gastos nos outros meses de recesso – janeiro e julho – também são elevados. “Já que há uma redução significativa da atividade parlamentar nos meses de recesso, seria interessante limitar ou vetar alguns gastos nesse período”, afirma o economista Evilásio Salvador, professor de políticas sociais da Universidade de Brasília (UnB).
A verba de ressarcimento é regulada pelas resoluções n.º 003/2004 e 003/2009. Há algumas limitações, como destinar no máximo 30% do valor total para gastos com combustíveis. Essa é a única despesa cujo saldo não é cumulativo. A maioria dos deputados costuma gastar em torno do teto mensal – R$ 5 mil. Os parlamentares também têm direito a cotas de transporte de R$ 9,3 mil e cota postal e telefônica de R$ 3,2 mil. Mas esses gastos não constam do Portal da Transparência.
Dezembro também registra um salto no gasto com correio. Os 54 deputados usaram, em média, R$ 20 mil entre janeiro e novembro em serviços postais. Em dezembro, a despesa foi quase quatro vezes maior: R$ 75 mil. Não por acaso, no Natal, milhares de paranaenses receberam em casa mensagens de boas festas de deputados.
De acordo com o regimento interno da Assembleia, a verba de ressarcimento é um recurso destinado, exclusivamente, ao atendimento das despesas de custeio realizadas pelo deputado no exercício do seu mandato.
Só podem ser reembolsadas mediante requerimento e comprovação do ato específico que a motivou. Os valores gastos são ressarcidos mediante apresentação de notas fiscais, que passam por checagem na Comissão de Tomada de Contas da Assembleia antes da devolução do dinheiro aos deputados.
Colaborou Guilherme R. Storck.
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