Congestionamento chegou a 20 quilômetros no sentido Rio
Manifestação de caminhoneiros fecha o trânsito na Rodovia Presidente Dutra
PABLO JACOB / AGÊNCIA O GLOBO
RIO — Após negociarem com a Polícia Militar e a Polícia Rodoviária Federal, os coordenadores do movimento grevista dos caminhoneiros decidiram liberar mais uma faixa de rolamento em cada sentido da Rodovia Presidente Dutra, em Barra Mansa. No fim da manhã, uma faixa da Via Dutra já havia sido liberada no sentido Rio, altura de Barra Mansa, depois de cerca de seis horas de interdição. Os caminhões permanecem impedidos de seguir viagem em ambos os sentidos. A reportagem do GLOBO identificou pelo menos dois veículos danificados por tentarem furar o bloqueio. A paralisação da categoria, que começou na tarde de domingo, completou 24h.
— A condição para a liberação dos caminhões é que Agência Nacional de Trasporte Terrestre(ANTT) venha conversar conosco. Paramos Belo Horizonte, Blumenau, Vitória e Rio — disse Odimar Meirelles, um dos coordenadores do movimento grevista e membro do Sindicato dos Transportadores Autônomos de Carga (Sinditac).
Mais de 24 horas após o início da greve de caminhoneiros a Dutra segue com 15 quilômetros de congestionamento no sentido Rio. No sentido São Paulo, de acordo com a PRF, o tráfego segue intenso. O bloqueio está concentrado próximo ao quilômetro 273, na altura do bairro de Vila Ursulino, em Barra Mansa.
Segundo o agente especial da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Mauro do Carmo, lotado em Barra Mansa, a corporação está com um número reduzido de agentes operando neste momento na rodovia. Ele afirmou não ser possível prever quando as pistas serão totalmente liberadas:
- Tem colega com 17 anos de profissão que nunca viu algo semelhante. Estamos trabalhando muito para manter pelo menos uma faixa liberada aos carros, ônibus e veículos de socorro, mas não é possível prever o desfecho disso tudo.
Questionado sobre os transtornos à população o sindicalista Odimar Meirelles afirmou que é parte do processo.
— Isso faz parte infelizmente, estão nos prejudicando também.
No início da tarde, um helicóptero do Grupamento Aero-Marítimo da Polícia Militar pousou próximo a um posto de gasolina, onde está concentrado o comando da greve dos caminhoneiros.
A Nova Dutra confirmou que grevistas formaram mais duas barreiras, na tarde desta segunda-feira, em outras duas cidades do Sul Fluminense. Uma delas está localizada no quilômetro 302, em Resende, no sentido Rio, e a outra no quilômetro 228, em Piraí, próximo à Serra das Araras, no sentido São Paulo. Nos dois locais, o congestionamento chega a dois quilômetros.
Protesto contra lei que regulamenta jornada de trabalho
De acordo com o presidente do Sindicato dos Transportadores Autônomos, Francisco de Bitencourt Ferreira, os caminhoneiros protestam contra a Lei 12.619, de 30 abril de 2012, que regulamenta a jornada de trabalho da categoria. A norma obriga o trabalhador a ter descanso de onze horas entre duas jornadas de trabalho, uma hora por dia de parada para almoço e repouso de 30 minutos a cada quatro horas rodadas, além de limitar a jornada a oito horas diárias. Se não cumprirem esta carga horária, os motoristas podem ser multados pela Polícia Rodoviária Federal.
O presidente do Sindicato dos Policiais Rodoviários do Estado do Rio (SPR), Marcelo Novaes, afirmou que o congestionamento na Via Dutra, provocado pelo protesto dos caminhoneiros, não tem relação direta com o movimento dos policiais rodoviários por melhores condições trabalho. Segundo Novaes, aconteceu apenas uma coincidência, mas ele admitiu que o problema não teria consequências tão graves se a PRF do Rio estivesse fiscalizando as rodovias com um efetivo pelo menos razoável.
— A PRF do Rio tinha em 1996 um total de 1.100 patrulheiros. Hoje tem apenas 450 trabalhando em quatro turnos. Dos 34 postos, apenas 17 estão funcionando. O sindicato deu apoio ao fechamento porque não era possível manter um patrulheiro apenas trabalhando em determinados postos por questões de segurança. O efetivo no mínimo aceitável para fiscalizar as rodovias federais do Rio seria de 1.200 homens. Os poucos policiais que atuam na Dutra estão negociando com os caminhoneiros para liberar as pistas, mas eles estão irredutíveis. Trabalhamos com uma quantidade ínfima de agentes. Não podemos tapar o sol com a peneira — disse o líder sindical.
Marcelo Novaes afirmou também que não há relação do movimento dos policiais rodoviários com os congestionamentos que aconteceram na tarde de quinta-feira na Nova Dutra; na manhã de sexta-feira na Rio-Petrópolis; e, e na noite do mesmo dia na BR-493 (Magé-Manilha) e na BR-101 (Niterói-Manilha), onde motoristas ficaram até seis horas parados em congestionamentos nas rodovias de acesso à Região dos Lagos.
— Há 16 anos tínhamos seis carros, com dois agentes cada um, patrulhando a Ponte Rio-Niterói e seus acessos. Hoje temos apenas um carro com dois homens. O posto de Itaguaí, que patrulha 200km de rodovia, do Rio a Paraty, incluindo o trecho das usinas nucleares, tem apenas cinco policiais por turno, um número inconcebível. São pontos sensíveis e de segurança nacional do nosso estado que estão sem negligenciados pelo governo federal na véspera da Copa do Mundo e das Olimpíadas — lamentou Novaes.
O vice-presidente do Sindicato dos Policiais Rodoviários do Rio (SPR), Ranir Almeida, disse que o sucateamento da PRF no Rio impediu que o serviço de inteligência do órgão detectasse o movimento dos caminhoneiros que está provocando o caos na Rodovia Presidente Dutra, em Barra Mansa. Segundo Almeida, a PRF tem 600 homens no Rio, dos quais 150 em funções administrativas. Os demais trabalham nas rodovias em regime de turnos. Segundo ele, o efetivo básico não é o ideal e deveria ser de mil homens.
— Nós não temos efetivo para atuar em contenção de distúrbios. Não há pessoal para isso. Se a inteligência detectasse o movimento dos caminhoneiros, o transtorno não estaria acontecendo. Os acidentes são atendidos emergencialmente, mas não há como cumprir missões não emergenciais porque não temos gente na pista. Este é o motivo também do fechamento de vários postos da PRF no Rio. O governo tem que se mobilizar para resolver o problema — reclamou o líder sindical.
Especialista em Direito de trânsito, o promotor de justiça Rogério Zouein responsabilizou o comando da Polícia Rodoviária Federal (PRF) pelo caos que os usuários da Rodovia Presidente Dutra estão enfrentando desde a tarde deste domingo. Zouein disse que faltou autoridade para desobstruir a principal via de ligação do Rio com São Paulo:
— Não há necessidade de se buscar um fundamento legal específico para que o poder público desobstrua a rodovia federal, se necessário utilizando-se a força policial. A nenhum cidadão ou categoria profissional, seja por qualquer razão, justa ou injusta, é dado o direito de obstuir uma rodovia de uso público, ainda mais a Rio-São Paulo. É algo muito além do direito sagrado de ir e vir. Trata-se da preservação da ordem pública — disse o promotor.
Ricardo Zouein também reclamou uma ação do governo do estado.
— A rodovia é federal, mas numa situação como esta, que atinje a vida do estado do Rio e de seus cidadãos — cobrou ele.
Motoristas passam a madrugada na estrada
A manifestação pegou de surpresa até mesmo alguns caminhoneiros. Morador de Nova Iguaçu e motorista de uma empresa que presta serviços de Sedex, Clei Anderson Santos, de 32 anos, disse que não concorda com a forma com que a manifestação está sendo feita.
— Se eu tentar furar o bloqueio, corro o risco de ter caminhão danificado. Existem outras formas de se manifestar. Poderia ter sido feito um ato em Brasília, que não prejudicasse as pessoas — sugeriu.
Clei tinha uma encomenda para entregar às 6h40m em Campinas, no estado de São Paulo, mas está parado no acostamento no sentido São Paulo desde meia-noite e meia.
Já o comerciante Marcelo Oliveira de Alencar, de 45 anos, saiu às 4h30m de Resende e somente por volta das 10h conseguiu fazer o retorno em um posto da PRF e retornar a sua cidade.
— O que estão fazendo é um absurdo. Vi ambulância com paciente, com atendimento marcado no Into, no Rio. Nada contra fazer protesto, nada contra a classe protestar. Mas as manifestações precisam ser feitas de formas mais respeitosas — criticou.
O policial rodoviário federal André Cunha, do posto de Floriano, em Barra Mansa, afirmou que a corporação está tendo muita dificuldade em fazer o trânsito fluir no sentido Rio da Via Dutra. — Já tivemos informações de que um caminhão foi depredado ao tentar furar o bloqueio. O comando da greve não está deixando nenhum caminhão passar.
O movimento não está recebendo a adesão de todos os caminhoneiros. Muitos deles, com carga perecível, tentam furar as barreiras, mas são impedidos.
A greve dos rodoviários vem causando transtorno e muita revolta entre os motoristas. Na altura do município de Quatis, no Sul Fluminense, os grevistas estão impedindo a passagem de qualquer tipo de veículo. O superintendente de um hospital de Niterói, Aílton Maia, está viajando desde domingo, vindo de Foz do Iguaçu. Ele criticou a forma que o movimento está sendo conduzindo no Rio.
— Estamos parados há três horas e meia. No Paraná também havia greve, mas eles estavam organizados e deixavam os carros de passeio trafegar. Aqui é uma bagunça, um desrespeito — reclamou.
O administrador de empresas André Faria, morador de Guadalupe, na Zona Oeste do Rio, está parado desde as 9h desta segunda-feira.
— O que está acontecendo é a ausência do poder público. A Polícia Rodoviária Federal está sendo conivente. Era para eu ter chegado ao trabalho às 10h — afirmou André, que tentou sair de Itatiaia rumo ao Rio na noite de domingo, mas precisou retornar e seguir viagem nesta manhã.
O aposentado Nei Reis e a esposa Maria da Piedade contam que ficaram parados por mais de cinco horas. — Saímos às 8h de Passa Quatro, no sul de Minas. Estamos com sede e fome. Estão barrando todo mundo, é um absurdo — disse Nei, morador da Tijuca, na Zona Norte do Rio.
Muitos ônibus que passam por Barra Mansa e Resende pela Via Dutra ficaram retidos no congestionamento, o que acabou atrapalhando a rotina de várias pessoas que dependem dos veículos. Na Rodoviária de Volta Redonda, no guichê de uma empresa que faz a linha em cidades do Vale do Paraíba paulista — Queluz, Lorena, Guará, Taubaté e São José — os veículos apresentaram atraso em todos os horários. Uma empresa que realiza viagens vindas do sul do país também teve problemas com o horário. De acordo com um funcionário, um ônibus que vinha de Curitiba com previsão de chegada às 9h chegou cinco horas depois do esperado.
Os ônibus que seguiam viagem para Resende tiveram as saídas canceladas desde o início da manhã, o que gerou grande transtorno para passageiros. A psicóloga Thaiza de Oliveira Melo chegou cedo na Rodoviária de Volta Redonda, às 6h, mas até às 11h não havia conseguido embarcar para chegar ao trabalho. — Estou aqui desde as 6h da manhã e pego no trabalho às 8h. Nem sei se vou conseguir chegar — disse.
O morador de Resende Vinícius Valério disse que chegou atrasado no trabalho na tarde de domingo e não sabia que horas chegaria em casa. — Eu trabalho aqui em Volta Redonda e no domingo cheguei atrasado. Saí às 17h de Resende e cheguei às 22h em Volta Redonda. E não sei que horas vou chegar em casa — lamentou.
Já agente de turismo, Tânia Maria da Silva, de 50 anos, ficou cerca de sete horas retida na Via Dutra, em Resende. Ela estava indo para Barra Mansa, após retornar de viagem ao Sul do país. - Fiquei bastante cansada depois de viajar vários quilômetros desde o Rio Grande do Sul dentro de um ônibus e fui obrigada aguardar ainda mais sete horas para chegar em casa. Se a pista não tivesse congestionada, o percurso entre Resende a Barra Mansa, onde moro, não levaria nem meia hora de viagem – protestou Tânia.
O prefeito de Volta Redonda, Antônio Francisco Neto (PMDB), saiu de sua cidade às 4h para um encontro com o ex-presidente Lula em São Paulo. Ele disse que conseguiu passar em direção a São Paulo, mas constatou que a situação é crítica em direção ao Rio:
— Os caminhões estão parados no acostamento e nas duas pistas. As autoridades precisam buscar uma solução urgente para o problema. Domingo foi o último dia das férias escolares. Muitas famílias que estavam em Itatiaia e em cidades paulistas estão voltando ao Rio e ficaram presas no engarrafamento. É um prejuízo para todo mundo. A reivindicação dos caminheiros é justa, o governo precisa negociar, mas as pessoas que não têm nada com isso não podem ser prejudicadas — afirmou o prefeito.
Para quem está em Barra Mansa e quer fugir do congestionamento na Dutra, a opção é seguir pelo distrito de Rialto. O motorista que optar por este trajeto deve entrar no bairro Bocaninha, seguir em direção a Colônia Santo Antônio, onde passará pela estrada de acesso a Rialto. Depois de cortar o distrito, o motorista deve entrar na estrada rural que dá acesso a Floriano, também em Barra Mansa, ou Bananal, em São Paulo.
Já quem deseja sair da Via Dutra, pode entrar no posto de combustível, em Floriano, onde terá acesso a estrada rural até Rialto. Mas, os motoristas devem ter cuidado, pois, a passagem é estreita. A outra alternativa é passar pelo bairro Santa Rita do Zarur, em Volta Redonda, e sair no distrito de Nossa Senhora do Amparo, em Barra Mansa, seguir 22 quilômetros por um estrada de chão até a cidade de Quatis, ou ainda sair em Floriano. Esta é a melhor opção para quem pretende seguir na Via Dutra, no sentido São Paulo.
Fábrica em Resende dispensa funcionários
Funcionários da fábrica de ônibus e caminhões Man Latin América (antiga Vokswagen), localizada no polo industrial de Resende, no Sul Fluminense, dispensou todos os seus funcionários às 15h, devido aos transtornos que os trabalhadores estão passando por causa da manifestação dos caminhoneiros em três pontos da Via Dutra: Barra Mansa, Piraí e Resende.
Já os funcionários da Peugeot-Citroen que saíram do plantão às 7h desta segunda-feira em seis ônibus da empresa — cada veículo com 40 operários de produção — da cidade de Porto Real, com destino a Volta Redonda e Barra Mansa, ficaram reditos próximo ao posto da PRF, em Porto Real, até por volta das 12h. Segundo a PRF, muitos passaram mal e outros sentiram fome e cede.
— Vários funcionários da Peugeot resolveram ir a pé, num percurso de 13 quilômetros, do posto da PRF, no distrito de Floriano, até o Centro de Barra Mansa — disse um funcionário da Pegeout.
Caminhões com legumes não conseguem chegar ao Rio
Muitos caminhões que transportavam legumes para Ceasa pela Dutra não conseguiram chegar ao Rio, afirma o presidente da Associação Comercial dos Produtores e Usuários da Ceasa Grande Rio (Acegri), Waldir Lemos. Segundo ele, dos 60 caminhões carregados de batatas vindos de São Paulo e do Paraná que chegariam à Ceasa, apenas dez conseguiram passar pelo protesto
— Os caminhões estão presos na altura de Barra Mansa, por essa razão os legumes não sairão com o preço padrão. A batata, que normalmente custa R$ 40 a saca, hoje (segunda) está chegando a R$ 100. Certamente esse valor será repassado para o consumidor — diz ele.
Centro de Barra Mansa congestionado
O congestionamento provocado pela manifestação de caminhoneiros na Via Dutra já afeta o Centro de Barra Mansa, por onde a estrada passa. A Guarda Municipal informou que as vias principais da cidade, que é cortada pela rodovia, estão paradas devido ao engarrafamento.
Os guardas estão nas principais saídas da cidade para orientar os motoristas. Já os agentes da 5ª delegacia da Polícia Rodoviária Federal, na Rodovia Lúcio Meira (BR-393), pedem aos caminhoneiros que seguem na pista sentido Volta Redonda para aguardar o fim da manifestação em posto de gasolina e no pátio dos postos da PRF, às margens da estrada.
Segundo a PRF, a recomendação é para prevenir uma complicação no trânsito em Volta Redonda, onde as duas rodovias são interligadas. Caso o fluxo de veículos aumente na BR-393, o congestionamento da Dutra pode avançar por Volta Redonda.