segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

#CHUVAS #RegiaoSerrana #RJ - Moradores desenvolvem síndrome traumática devido à tragédia das chuvas em Nova Friburgo

 
Edmilson Silva com três do seus quatro filhos em frente à casa onde vive com a família em Nova Friburgo: "É só falar em chuva que minha mulher chora" Foto: Bruno Gonzalez / Extra  
 
Por Clarissa Monteagudo e Talita Corrêa

Quando as chuvas se abateram sobre a Região Serrana, não foram só barrancos, pontes e prédios que despencaram. A sensação de segurança e paz, o passado e o futuro de milhares de moradores ruíram sob a fúria da natureza. Órfãos em sua terra natal, deserdados do paraíso, as vítimas agora convivem com outra face da tragédia: o medo. A cada chuva forte em Friburgo surge o pânico em uma cidade que convive com seus fantasmas: escombros das casas destruídas e denúncias de corrupção. É a síndrome do trovão.

— Agora, há uma aflição real. Quantas e quantas pessoas perderam tudo: casa, família, futuro e passado? Ficaram sem documento, sem escola, a receita do remédio, todas as referências. É um sofrimento muito grande. Elas estão muito assustadas diante da possibilidade de um novo acontecimento. Nada foi feito para evitar. É uma ameaça real — explica Fátima Vasconcelos, presidente da Associação Psiquiátrica do Rio de Janeiro, que coordena uma equipe de psiquiatras voluntários na Região Serrana.

Segundo a prefeitura, Nova Friburgo apresentou em 2011 o número de 1.400 atendimentos mensais de moradores com transtornos mentais. Uma quantidade 30% maior que a dos anos anteriores. De acordo o psicólogo José Maria Gomes, que presta assessoria técnica à Clínica de Psiquiatria Santa Lúcia, a volta das chuvas causa um transtorno pré-traumático, que atinge quem passou ileso pela catástrofe no ano passado, mas teme ser vítima de nova tragédia.

As marcas do heroísmo estão gravadas em dez pontos na mão do vendedor Edmilson Silva, de 41 anos, que se agarrou a uma cerca de arame para salvar um dos quatro filhos. A família inteira guarda no peito a angústia.

— Não dormimos há seis dias. Cai um pingo do céu e os meninos correm para minha cama, apertados, tremendo. É só falar algo sobre chuva que minha mulher chora. Meu irmão lembra da sobrinha da mulher dele, de 13 anos, que encontrou morta debaixo da terra. Fica calado. Meus filhos se recordam de amiguinhos que morreram e dizem que foram encontrados irreconhecíveis "sem um monte de parte do corpo". Como pode crianças conviverem com lembranças assim? — questiona ele.

Depoimento

O trauma vivido no ano passado não sai da cabeça de Edmilson:

Era o dia 12 de janeiro de 2011 quando o mundo pareceu que ia acabar. Vi uma casa mais alta despencar, depois outra e outra. Peguei meus quatro filhos. Demos as mãos, rezamos e corremos até a porta. Em três segundos, perdi todos. A violência da água me arrastou e arrancou minha roupa. Quando vi meu menino mais novo preso a um bambuzinho, segurei-me em uma cerca de arame com toda força do mundo e puxei ele pelo cabelo. Depois um relâmpago alumiou tudo, e achei o menino do meio. Só ouvia a chuva, parecia o som do fim do mundo. Cheguei à casa do meu primo, sem conseguir nem chorar. Disse: 'Perdi meus meninos'. Ele falou: 'Calma. Estão comigo'. E desabei no choro mais longo da minha vida.

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