sábado, 5 de fevereiro de 2011

ROMBO EM FURNAS - Empresa de Eduardo Cunha deu CALOTE

O globo
RIO - Pressionada pelos sócios, Furnas Centrais Elétricas cobriu os prejuízos causados pela participação da Companhia Energética Serra da Carioca II na sociedade montada para construir e explorar a Usina Hidrelétrica da Serra do Facão , em Goiás. As perdas para a estatal, que superam R$ 100 milhões, incluem o pagamento de um empréstimo de R$ 60 milhões, tomado em abril de 2008 pela empresa Serra da Carioca II junto ao ABN AMRO Real, que teve como garantia as próprias ações da sociedade e não foi honrado. ( Leia também: Para especialista, loteamento de cargos mostra 'absolutismo anacrônico' do país )
Pivô da crise que causou a saída de Carlos Nadalutti da presidência de Furnas, substituído por Flávio Decat, a Serra da Carioca II teve entre os membros do Conselho de Administração o ex-presidente da Cedae Lutero de Castro Cardoso, apadrinhado político do deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ). É atribuída ao mesmo parlamentar a indicação da diretoria de Furnas que, na época, autorizou o negócio.
Presidente da estatal omitiu desembolso
O desembolso feito por Furnas, depois de ação judicial proposta pela Alcoa, outra sócia do negócio, foi omitido da carta enviada por Nadalutti ao ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, para explicar a operação suspeita.
O então presidente da estatal alegou que, ao comprar da Serra da Carioca II, por R$ 80 milhões , um lote de ações que fora adquirido pelo sócio por R$ 6,9 milhões sete meses antes, Furnas teria compensado supostos aportes feitos pela empresa privada no período.
Termo de compromisso assinado por Furnas, cujo conteúdo foi obtido pelo GLOBO, revela outra situação: a estatal não apenas teve de cobrir o calote bancário da Serra da Carioca II, sob pena de ser excluída do investimento, como também assumiu aportes de mais de R$ 16 milhões que a empresa ligada a Eduardo Cunha deixara de fazer no empreendimento, contrariando as suas obrigações societárias.
O desembolso de Furnas levou a Alcoa a desistir de um pedido de arbitragem em São Paulo e de uma ação judicial, com medida cautelar, aberta na 51ª Vara Cível do Rio de Janeiro, para obrigá-la a pagar. Se os compromissos de Serra da Carioca II não fossem honrados, Furnas corria o risco de ser forçada a vender a sua participação no negócio por 90% do valor de face das ações.
Revelada pelo GLOBO, a operação é agora alvo de uma investigação na Controladoria Geral da União (CGU), que não considerou satisfatórias as explicações de Nadalutti.
Desde setembro de 2007, quando o ex-prefeito Luiz Paulo Conde assumiu a presidência da estatal, Furnas é feudo do PMDB fluminense. Um ano depois, doente, Conde foi substituído por Nadalutti, que, em entrevista ao jornal, reconheceu ser filiado ao PMDB de Goiás e ter chegado ao cargo por indicação política.
Criada em dezembro de 2007, duas semanas antes de entrar no negócio com Furnas , a Serra da Carioca II faz parte do Grupo Gallway, sediado em paraíso fiscal no Caribe. Um de seus executivos é Lúcio Funaro, o mesmo empresário que alugava o apartamento ocupado, em 2003, no flat Blue Tree Towers (em Brasília), por Eduardo Cunha - o parlamentar, porém, sustenta que não conhece Funaro.
Para participar do empreendimento, Furnas montou, ao lado da administradora de fundos Oliveira Trust Service, sociedade com propósitos específicos: Serra do Facão Participações. A parceria com a empresa privada foi a alternativa encontrada para superar as restrições legais que impediam estatais de atuar como sócias majoritárias.
Sendo assim, Furnas deteve 49% das ações, e a Oliveira Trust, 51%. Uma cláusula contratual, porém, garantia à estatal a opção de compra das ações do sócio. Esta sociedade, para participar do projeto da usina, teve de fazer parte de outra, a Serra do Facão Energia, que tinha como sócios a Alcoa Alumínio, a Camargo Corrêa Energia e a DME Energética.
Porém, no mesmo mês em que a Serra da Carioca II foi criada, Furnas renunciou à preferência de compra do lote de ações da Oliveira Trust. A desistência abriu caminho para o ingresso da empresa ligada a Eduardo Cunha no negócio.
A construção da usina em Goiás seria alavancada por um financiamento do BNDES, no valor de R$ 400 milhões. Semanas antes da assinatura do contrato, Serra da Carioca II tomou o empréstimo de R$ 60 milhões do ABN AMRO Real para cumprir parte da obrigação de aporte de capital no negócio, que era de quase R$ 100 milhões.
O negócio, porém, começou a complicar para Furnas e seu sócio privado em junho, quando o BNDES negou o empréstimo. Ao levantar informações sobre o quadro societário da Serra da Carioca II, o banco teria descoberto que sua sede ficava em paraíso fiscal, e que alguns dos seus sócios estavam envolvidos em escândalos financeiros.
No mesmo mês, Furnas recebeu comunicado do ABN AMRO Real de que iria executar os seus direitos sobre as ações alienadas. Sem o financiamento, Serra da Carioca decidiu sair do negócio, mas havia um impedimento legal para Furnas comprar a sua parte e assumir integralmente a sociedade.
Na época, Cunha, o mesmo deputado que indicara a diretoria da estatal e tinha amigos entre os gestores da Serra da Carioca, apresentou e conseguiu aprovar mudança na lei, permitindo que estatais do setor elétrico fossem acionistas majoritárias de consórcios "que se destinem à exploração da produção ou transmissão de energia elétrica sob regime de concessão ou autorização".
Vencido o obstáculo, em julho, Serra da Carioca II vendeu para Furnas o lote de ações que tinha comprado por R$ 6 milhões por R$ 80 milhões e finalmente deixou o negócio.
Procurada desde a manhã desta sexta-feira e comunicada sobre o teor da reportagem em duas mensagens, Furnas optou por não responder ao jornal até o fechamento da edição, à noite. A Alcoa também foi procurada e não respondeu.

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