Candidato à presidência da república, Juscelino Kubitschek iniciou a sua campanha em Jataí, cidadezinha no sudoeste de Goiás. Por quê?
Ora, ali estava o maior reduto pessedista goiano. Portanto, naquele 3 de abril de 1955, Jataí sentia-se honrada por JK a ter escolhido para fazer o seu primeiro comício eleitoral.
Por causa da chuva, o palanque teve de ser transferido para um velho galpão. Animado com a pequena multidão que o ouvia, Juscelino não fez por menos. Declarou que seu principal propósito era cumprir integralmente a Constituição!
Quando acabou de expor a sua plataforma de governo, colocou-se à disposição para qualquer pergunta. Diante da quietude e timidez da plateia, insistiu:
- Povo de Goiás, pode falar, quero saber do que vocês precisam, quero conhecer os problemas de vocês.
Ouviu-se, então, uma voz acanhada.
Ouviu-se, então, uma voz acanhada.
- Já que V.Exa. está anunciando o propósito de cumprir integralmente a Constituição, queria saber se, eleito fosse, construiria a Capital no Planalto, conforme nela consta?
Todos escutaram a chuva caindo mais forte. O impacto da pergunta causara um silêncio embaraçador. E o candidato à presidência da república parecia tomar fôlego para responder.
- É uma pergunta muito feliz. Não havia pensado, nem os meus assessores, neste problema. Mas vou fazer de sua pergunta o objetivo principal de minha campanha de candidato, e de minha administração, se eu for eleito.
A mesma voz, embora tranquila, se fez ouvir provocadora.
- O senhor vai ter peito e disposição para assumir este compromisso?
O desafio estava feito.
Dois anos depois, JK voltou a Jataí para anunciar que estava cumprindo com a palavra. A nova capital do país estava sendo construída. Nessa ocasião, fez questão de identificar o rapaz que o desafiara. O jovem era muito popular e conhecido por Toniquinho. Tiraram fotos juntos.
Anos se passaram e Juscelino contaria esta história mais de uma vez ao se referir à construção de Brasília. Uma delas foi durante uma entrevista à revista Manchete, em fins de 1972. Arnaldo Niskier era diretor do departamento de jornalismo da Bloch Editores, no Rio de Janeiro.
Na época, eu trabalhava como repórter da revista e fui chamada à sala de Niskier. Ele tinha me reservado a incumbência de descobrir o tal Toniquinho. Quer dizer, escalara-me para fazer uma reportagem especial com "a mola propulsora da construção de Brasília".
Consegui apurar a partir de vários telefonemas para Goiânia que o personagem chamava-se Antônio Soares Neto. Vivo ou morto? Ninguém sabia. Fui conferir em Jataí, acompanhada do fotógrafo Luiz Alberto. Pergunta daqui, anda dali e, de Toniquinho em Toniquinho, chegamos ao verdadeiro: o coletor estadual da cidade.
Encontramos o nosso herói no fórum, entregue aos afazeres da coletoria. Lembro-me bem. Baixo, um jeito de andar empinado, uma farta cabeleira castanha e longas costeletas. Mostrou-se surpreso apenas por alguns instantes. Seu rosto não demorou a demonstrar a satisfação de se sentir lembrado e procurado como "pessoa importante".
Estava com 47 anos, casado e pai de quatro filhos. Mostrou-me, em sua casa, a foto com JK. E, sem falsa modéstia, considerava-se responsável pela construção de Brasília. Disse-me:
- Não havia passado pela cabeça do Juscelino a construção da Capital lá no Planalto. Fui eu, realmente, que levantei a questão. Brasília não estava nos planos de seu governo.
Agora, em entrevista à Revista de História da Biblioteca Nacional (nas bancas), Margareth da Silva Pereira, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, levanta um ponto interessante:
"Brasília faz 50 anos ou 200 anos?" Segundo a professora, José Bonifácio e outros intelectuais do fim do século XVIII e começo do XIX já escreviam sobre a questão estratégica da ocupação do território central brasileiro.
Ateneia Feijó é jornalista
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