terça-feira, 5 de junho de 2012

TÔ DE OLHO - Jogadores abusaram de analgésicos durante a Copa de 2010, diz Fifa


Matt McGrath
Repórter de ciência do Serviço Mundial da BBC
Atualizado em 5 de junho, 2012 - 05:42 (Brasília) 08:42 GMT


Pressão para voltar rapidamente ao campo leva jogadores a ingerir medicamentos, diz Fifa

O "abuso" de analgésicos está colocando em risco a saúde de longo prazo de jogadores de futebol no mundo, advertiu o chefe do departamento médico da Fifa, Jiri Dvorak.

Em entrevista à BBC, ele afirmou que 39% dos jogadores da Copa do Mundo de 2010 tomaram medicação contra dor antes de todos os jogos disputados - os níveis mais altos já registrados.

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O dado, publicado recentemente pelo British Journal of Sports Medicine, foi obtido em uma pesquisa feita pela Fifa, que pediu aos médicos das seleções que listassem os medicamentos tomados pelos atletas antes das partidas da Copa da África do Sul.

Pesquisas anteriores em torneios internacionais também identificaram o uso de diversos tipos de analgésicos e anti-inflamatórios não-esteroidais (nsaids, na sigla em inglês) entre um alto número de jogadores.

Em meio aos preparativos para a Eurocopa, Dvorak instou os envolvidos no esporte a despertar para o problema, alegando que jogadores jovens estão imitando os veteranos e ingerindo analgésicos com frequência excessiva.

Analgésicos na Copa

Na Copa de 2010, o uso de medicamentos variava bastante entre os países. Mas algumas seleções ministravam até três remédios diferentes por jogador por partida.

Durante a competição, diz a pesquisa publicada no British Journal of Sports Medicine, 71,7% de todos os jogadores se medicaram, e 60,3% (ou 444 de 736 jogadores) ingeriram analgésicos ao menos uma vez. E jogadores das Américas do Norte e do Sul tomaram quase o dobro de medicamentos do que os jogadores dos demais continentes.

"A medicação reportada pelos médicos dos times em competições internacionais de futebol está aumentando", diz o estudo, de autoria do próprio Jiri Dvorak e de Philippe Matthias Tscholl, do centro de pesquisas médicas da Fifa.

"O uso sistemático - medicação em cada partida - pareceu ser a norma em alguns times. Isso terá implicações na saúde dos jogadores. Os dados estimulam esforços para entendê-los melhor e para lidar com essa prática potencialmente desastrosa no esporte profissional."

"Podemos dizer que há um abuso, que pode afetar o funcionamento dos rins e do fígado. É algo que teremos que examinar no longo prazo", disse Dvorak à BBC.

Os perigos são especialmente altos para os rins, que já são sobrecarregados pela prática de esportes de alta intensidade como o futebol. Mas acredita-se que os efeitos colaterais dessas drogas se estendam ao coração.

Pressão para voltar ao gramado

Para Dvorak, o amplo uso de analgésicos é estimulado pela pressão feita sobre médicos dos times, para que tratem lesões rapidamente, de forma que os jogadores possam voltar logo a campo.

"O que vemos dos estudos da Fifa é que muitas vezes os jogadores ingerem analgésicos preventivamente, para evitar uma dor que pode ocorrer, para ficar insensível à dor. O problema é que, se você desliga o alarme que protege os seus tecidos, pode destruí-los de maneira irreversível."

Hans Geyer, vice-diretor da Agência Mundial Antidoping (Wada)

"A maioria dos médicos das equipes está sob pressão entre o diagnóstico (seguido do) tratamento apropriado e devolver o jogador ao campo", prosseguiu Dvorak. "Se eles demoram muito (para realizar o tratamento), podem perder seu emprego."

O ex-jogador alemão Jens Nowotny conhece em primeira mão a força que essa pressão exerce no meio esportivo.

"É difícil quando alguém do clube vem e diz que é importante que você jogue, porque seu time precisa de você", disse. "A decisão é sua, mas você não consegue ignorar a pressão ao seu redor. E os médicos são pressionados também."

Outros cientistas consultados pela BBC reiteram a preocupação da Fifa. "É um sinal alarmante", afirmou Hans Geyer, vice-diretor da Agência Mundial Antidoping (Wada).

"O que vemos dos estudos da Fifa é que muitas vezes os jogadores ingerem analgésicos preventivamente, para evitar uma dor que pode ocorrer, para ficar insensível à dor. O problema é que, se você desliga o alarme que protege os seus tecidos, pode destruí-los de maneira irreversível", alerta.

Futebol americano

Essa mesma pressão se repete em outros esportes. Nos Estados Unidos, 12 ex-jogadores da Liga de Futebol Americano (NFL) estão processando o órgão por conta do uso da uma poderosa droga anti-inflamatória chamada Toradol.

Os jogadores alegam que a medicação mascarou a dor causada por lesões na cabeça, levando a concussões. Eles dizem que, em alguns casos, faziam fila para receber injeções de Toradol, estando lesionados ou não.

Para Tanya Hagen, do centro médico da Universidade de Pittsburgh e consultora médica da equipe Pittsburgh Steelers, o problema é agravado pela facilidade com que os medicamentos circulam no meio esportivo.

"Muitos dos atletas com quem eu trabalho tomam anti-inflamatórios sem me avisar. Às vezes não vemos os atletas a não ser que eles achem que a lesão é grave o suficiente para que venham se consultar", disse.

"Temos que mudar de mentalidade", agregou Dvorak. "Esse fenômeno cultural ocorre porque esses medicamentos estão facilmente disponíveis."

Para ele, o mais alarmante é o fato de que competições sub-17 também estão registrando altos índices de uso de anti-inflamatórios. "O futebol tem que acordar, porque os mais jovens estão copiando o comportamento dos mais velhos", opinou.eúdo de sites externos

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