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Ricardo Lewandowski, o ministro incumbido de revisar o processo do mensalão, abespinhou-se com o ter de um ofício que lhe foi remetido na semana passada pelo colega Carlos Ayres Britto, presidente do STF. Enxergou na peça uma pressão indevida para apressar a entrega do seu voto, sem o qual o julgamento não pode ser iniciado. Reagiu por meio de outro ofício, endereçado a Ayres Britto nesta segunda (25).
Anotou: “Conforme é de conhecimento público, tenho envidado todos os esforços possíveis para não atrasar um só dia o julgamento desse importante feito, sobretudo porque sempre tive como princípio fundamental, em meus 22 anos de magistratura, não retardar nem precipitar o julgamento de nenhum processo, sob pena de instaurar odioso procedimento de exceção.”
Noutro trecho, estranhou que a cobrança de Ayres Britto tenha chegado às manchetes antes de bater em sua mesa: “Tirante o inusitado da situação, confesso que fiquei surpreso com a informação constante do mencionado ofício, visto que o plenário desta Suprema Corte, na sessão administrativa de 6/6/2012, aprovou, pelo voto unânime dos presentes, o cronograma do julgamento da ação penal […], fixando o seu início em l°/8/2012, ‘sob a condição de o revisor liberar o processo até o final de junho de 2012’.”
Na correspondência que tirou Lewandowski do sério, Ayres Britto indagara ao colega se ele tinha “processos” para incluir na pauta do STF no dia 1º de agosto. O texto não fez menção ao mensalão. Nem precisava. Não há outro processo previsto para o mês de agosto.
A inusitada batalha de ofícios é travada contra um pano de fundo em que reluz o calendário. Para que o julgamento possa começar em 1º de agosto, o Supremo precisa cumprir dois prazos previstos em seu regimento. Concluído o voto do revisor, o STF precisa dar ciência do seu teor aos 38 réus e ao Ministério Público. Depois, precisa publicar o texto pelo menos dois dias antes do início do julgamento.
O diabo é que o Supremo vai ao recesso do meio do ano na próxima sexta (29). Quer dizer: se o voto de Lewandowski não for publicado antes do final de semana, o julgamento terá de ser adiado. O revisor e o presidente do tribunal divergem na interpretação do regimento.
Na conta de Ayres Britto, são necessárias 48 horas para dar ciência do voto às partes e mais 48 horas para a publicação. Ou seja: como Lewandowski não entregou seu voto nesta segunda (25), os procedimentos não poderão ser observados até sexta. O julgamento, portanto, já estaria fadado ao adiamento.
Para Lewandowski, o primeiro prazo é de 24 horas, não de 48 horas. Segundo essa interpretação, o processo ainda poderia descer à pauta do dia 1º de agosto se o voto-revisor for entregue nesta terça (26). De resto, o ministro realçou em seu ofício que o Supremo é soberano na interpretação do seu próprio regimento.
Escreveu: “[…] Quer me parecer que o STF tem todas as condições de cumprir o cronograma já estabelecido e de iniciar o julgamento da ação penal […] na data aprazada, considerando que o egrégio Plenário, integrado por experimentados juízes, detém a última palavra no que concerne à interpretação e ao alcance das normas regimentais – e que, como visto, entendeu que eu deveria -insisto – ‘liberar o processo até o final de junho de 2012’ para que o cronograma por ele estabelecido possa ser cumprido.”
Se quiser, o STF pode, de fato, ajustar o regimento às conveniências. Mas isso abriria brecha para que os advogados dos réus questionassem a mudança de regras no meio do jogo. Assim, na melhor hipótese, Lewandowski entrega o seu voto hoje e, se suas contas estiverem mais corretas que as de Ayres Britto, o tribunal corre para cumprir os prazos até sexta.
Na pior hipótese, o revisor empurra a entrega do seu voto para as fronteiras do recesso e a agenda de 1º de agosto vai para as cucuias. Bom para os mensaleiros, já que o ministro Cezar Peluso, tido como integrante da banda de ministros com pendores de condenar, correria o risco de aposentar-se antes da conclusão do julgamento. Vai abaixo a íntegra do ofício de Lewandowski a Ayres Britto:
Senhor Presidente,
Por meio do Ofício 264/GP, que trata da “publicação da pauta de julgamentos”, recebi de Vossa Excelência a informação segundo a qual “o dia 25 de junho de 2012 é a data final para a liberação de processos a serem julgados a partir do primeiro dia do mês de agosto deste ano ” (grifei). Divulgada a correspondência para a mídia, antes mesmo de chegar ela ao meu conhecimento, jornal de circulação nacional destacou, em subtítulo de notícia sobre o tema, o seguinte: “Presidente do STF advertiu por escrito Lewandowski…”
Tirante o inusitado da situação, confesso que fiquei surpreso com a informação constante do mencionado ofício, visto que o Plenário desta Suprema Corte, na Sessão Administrativa de 6/6/2012, aprovou, pelo voto unânime dos presentes, o cronograma do julgamento da Ação Penal 470 de Minas Gerais, fixando o seu início em l°/8/2012, “sob a condição de o revisor liberar o processo até o final de junho de 2012″ (cf. ata da sessão anexa – grifei).
Nos exatos termos do cronograma estabelecido pelo egrégio Plenário, anunciei que liberaria, como de fato liberarei, o meu voto-revisor “até o final de junho de 2012″. Conforme é de conhecimento público, tenho envidado todos os esforços possíveis para não atrasar um só dia o julgamento desse importante feito, sobretudo porque sempre tive como princípio fundamental, em meus 22 anos de magistratura, não retardar nem precipitar o julgamento de nenhum processo, sob pena de instaurar odioso procedimento de exceção.
Diante do exposto, quer me parecer que o STF tem todas as condições de cumprir o cronograma já estabelecido e de iniciar o julgamento da Ação Penal 470/MG na data aprazada, considerando que o egrégio Plenário, integrado por experimentados juízes, detém a última palavra no que concerne à interpretação e ao alcance das normas regimentais – e que, como visto, entendeu que eu deveria -insisto – “liberar o processo até o final de junho de 2012″ para que o cronograma por ele estabelecido possa ser cumprido.
Sem mais para o momento, aproveito o ensejo para enviar a Vossa Excelência os meus cumprimentos.
Ministro Ricardo Lewandowski”
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