Urgências médicas entopem o Judiciário
Por Flávio Araújo e Pâmela Olieira
Cerca de 13 mil pedidos de remédio, leito ou exame tramitam na Justiça do Rio e 80% do atendimento nos plantões da Defensoria são emergências em saúde
A saúde de Victória depende de remédios entregues com atraso pela prefeitura após ordem judicial| Foto: Carlo wrede / Agência O Dia
O caso não é isolado: cerca de 13 mil processos com pedidos de remédios, internação e autorizações para exames tramitam no Tribunal de Justiça do Rio.
Oitenta por cento dos atendimentos nos plantões da Defensoria são emergências médicas. “São pedidos urgentes, que não podem esperar. Uma pessoa que precisa de leito de CTI ou um acidentado que precisa ser transferido para hospital com neurologista, por exemplo. Há também pedidos de autorização de exames não autorizados pelos planos de saúde”, explica a coordenadora do Núcleo de Fazenda Pública da Defensoria, Fernanda Garcia.
Fora dos plantões, reivindicações de saúde são 65% do atendimento do Núcleo de Fazenda Pública. Nessa estatística, está Edineia da Cruz Silvério, 65, doente renal que usa 12 medicamentos, um deles custa R$ 200. “Não tenho saúde para enfrentar fila para pedir o remédio. Minha filha vai”, conta Edineia.
Mesmo com ordem judicial, Victória sofre com atrasos na entrega de dois tipos de insulina. “É desesperador. A caixa vai acabando e não sei se a prefeitura vai entregar”, desabafa Fernanda Pimentel, acrescentando que a medicação custa R$ 300 por mês.
Mil ‘consultas médicas’ na Defensoria só este ano Mais de mil pessoas já recorreram à Defensoria em busca de remédios, transferências e leitos de CTI desde o início deste ano. Só no Núcleo de Fazenda Pública, que atua quando o problema é na saúde municipal ou estadual, foram 991 de janeiro a outubro.
“Isso mostra a falência do sistema de saúde. É assustador não só no Rio, mas no Brasil”, comenta a presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB, Margarida Pressburger.
Para tentar reduzir a demanda, vigora desde 2007 protocolo de intenções entre a Defensoria e as secretarias estadual e municipal de Saúde para retirada de remédios. A medida não reduziu as ações, mas agilizou o atendimento. “Tem muito medicamento de fora da lista: nem município nem estado se responsabilizam. Aí, é preciso entrar com ação”, diz Fernanda.
Em nota, o município diz que busca atender as transferências, “mediante disponibilidade, no menor prazo possível”. Para o estado, não é possível “assumir toda a responsabilidade pela assistência à saúde”. Sobre Victória, o município admite “atrasos eventuais em função de demora na entrega do produto pelo fabricante”.
Mil ‘consultas médicas’ na Defensoria só este ano Mais de mil pessoas já recorreram à Defensoria em busca de remédios, transferências e leitos de CTI desde o início deste ano. Só no Núcleo de Fazenda Pública, que atua quando o problema é na saúde municipal ou estadual, foram 991 de janeiro a outubro.
“Isso mostra a falência do sistema de saúde. É assustador não só no Rio, mas no Brasil”, comenta a presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB, Margarida Pressburger.
Em nota, o município diz que busca atender as transferências, “mediante disponibilidade, no menor prazo possível”. Para o estado, não é possível “assumir toda a responsabilidade pela assistência à saúde”. Sobre Victória, o município admite “atrasos eventuais em função de demora na entrega do produto pelo fabricante”.
Planos de saúde na berlinda O setor de urgência do Núcleo de Defesa do Consumidor, da Defensoria Pública do Rio, existe praticamente para atender problemas com planos de saúde. As recusas de atendimento dos planos representam 99% das solicitações. Há 3 anos, o índice era de 40% dos pedidos.
“As pessoas sofrem acidente, derrame ou complicação do parto e precisam de cirurgias e CTI. Os planos querem mantê-las no máximo 12 horas no CTI, o que é um absurdo”, explica a defensora Tatiana Pessoa.
“A DEMORA PODE LEVAR À MORTE”
5 MINUTOS COM: FERNANDA GARCIA ENTREVISTADA
Coordenadora do Núcleo de Fazenda Pública da Defensoria Pública, Fernanda Garcia presencia diariamente a agonia de pessoas que buscam na instituição a possibilidade de acesso a um dos direitos mais básicos e garantido pela Constituição Federal, no artigo 196: a saúde. Para ela, muitas vezes é difícil não se abalar com o sofrimento dos que pedem socorro.
1. A procura por saúde está aumentando? — As demandas de saúde hoje são carro-chefe do Núcleo de Fazenda Pública. Quando chega alguém com pedido de leito de CTI ou remoção é um desespero. A gente para tudo porque a demora pode levar o doente à morte.
2. A senhora lembra de algum caso mais difícil? — Uma vez, um jovem pedia a transferência da mãe, que precisava de CTI. Durante o atendimento, o irmão chegou gritando que ela tinha morrido. O rapaz teve uma crise de epilepsia. Quando eles saíram, fiquei chorando por duas horas.
3. Que outro atendimento a marcou? — Um menino de 13 anos queimou o braço na rede elétrica quando soltava pipa. Ele estava no Souza Aguiar e a mãe chegou desesperada porque iam amputar o braço dele. A única forma de evitar isso era um tratamento que só existia na rede privada. Consegui a liminar e ele fez o tratamento.
4. Consegue-se sempre aquilo de que se precisa? — Efetivar a decisão judicial às vezes é complicado. Quando o remédio não é encontrado, uma possibilidade é o bloqueio do valor da medicação da conta do estado ou do município. A pessoa retira o valor e compra.
5. Quantas pessoas recorrem a vocês em busca de ajuda em saúde? — Chega a 30, 40 por dia. Às vezes não tem mesmo vaga de CTI na rede, então, a gente pede em hospital particular com as despesas pagas pelo estado. Já internei até no Copa D’Or. O ideal seria que as pessoas tivessem acesso à saúde pública sem a necessidade do auxílio da Defensoria. Mas, se isso não ocorre, estamos aqui.
“Contamos com a ajuda dos amigos”
“Para o tratamento de minha mãe (a aposentada Edineia Silvério), contamos com a ajuda de amigos. Sem cadeira de rodas, dependemos de carona para que ela faça as três sessões de hemodiálise. A questão dos remédios também é um problema: vou quase todo mês à Defensoria buscar o que ela precisa”.
SILVIA MARIA VIEIRA PEDROTE, dona de casa, 57 anos
Fonte O Dia http://odia.ig.com.br/portal/rio/html/2011/11/urgencias_medicas_entopem_o_judiciario_204413.html
“As pessoas sofrem acidente, derrame ou complicação do parto e precisam de cirurgias e CTI. Os planos querem mantê-las no máximo 12 horas no CTI, o que é um absurdo”, explica a defensora Tatiana Pessoa.
“A DEMORA PODE LEVAR À MORTE”
5 MINUTOS COM: FERNANDA GARCIA ENTREVISTADA
Coordenadora do Núcleo de Fazenda Pública da Defensoria Pública, Fernanda Garcia presencia diariamente a agonia de pessoas que buscam na instituição a possibilidade de acesso a um dos direitos mais básicos e garantido pela Constituição Federal, no artigo 196: a saúde. Para ela, muitas vezes é difícil não se abalar com o sofrimento dos que pedem socorro.
1. A procura por saúde está aumentando? — As demandas de saúde hoje são carro-chefe do Núcleo de Fazenda Pública. Quando chega alguém com pedido de leito de CTI ou remoção é um desespero. A gente para tudo porque a demora pode levar o doente à morte.
2. A senhora lembra de algum caso mais difícil? — Uma vez, um jovem pedia a transferência da mãe, que precisava de CTI. Durante o atendimento, o irmão chegou gritando que ela tinha morrido. O rapaz teve uma crise de epilepsia. Quando eles saíram, fiquei chorando por duas horas.
3. Que outro atendimento a marcou? — Um menino de 13 anos queimou o braço na rede elétrica quando soltava pipa. Ele estava no Souza Aguiar e a mãe chegou desesperada porque iam amputar o braço dele. A única forma de evitar isso era um tratamento que só existia na rede privada. Consegui a liminar e ele fez o tratamento.
4. Consegue-se sempre aquilo de que se precisa? — Efetivar a decisão judicial às vezes é complicado. Quando o remédio não é encontrado, uma possibilidade é o bloqueio do valor da medicação da conta do estado ou do município. A pessoa retira o valor e compra.
5. Quantas pessoas recorrem a vocês em busca de ajuda em saúde? — Chega a 30, 40 por dia. Às vezes não tem mesmo vaga de CTI na rede, então, a gente pede em hospital particular com as despesas pagas pelo estado. Já internei até no Copa D’Or. O ideal seria que as pessoas tivessem acesso à saúde pública sem a necessidade do auxílio da Defensoria. Mas, se isso não ocorre, estamos aqui.
“Contamos com a ajuda dos amigos”
“Para o tratamento de minha mãe (a aposentada Edineia Silvério), contamos com a ajuda de amigos. Sem cadeira de rodas, dependemos de carona para que ela faça as três sessões de hemodiálise. A questão dos remédios também é um problema: vou quase todo mês à Defensoria buscar o que ela precisa”.
SILVIA MARIA VIEIRA PEDROTE, dona de casa, 57 anos
Fonte O Dia http://odia.ig.com.br/portal/rio/html/2011/11/urgencias_medicas_entopem_o_judiciario_204413.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário