quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

SALÁRIO MÍNIMO - Neopeleguismo e moderação

A cena mais impactante da aprovação do novo salário mínimo na Câmara dos Deputados foi a vaia dos sindicalistas presentes a um ícone do movimento, o petista Vicentinho, relator do projeto aprovado e ex-presidente da CUT, a maior central sindical do país.
Pode-se falar em neopeleguismo, claro. Mas, sob pressão até do ex-presidente Lula, o enquadramento de Vicentinho e da CUT nessa questão revela como em alguma medida a difamada "República sindicalista" traz ao menos um ganho importante ao país: moderação.
A classe operária (ou as elites sindicais) foi ao paraíso no reino de Lula. Segundo cálculos da cientista política Maria Celina D'Araújo, da PUC-RJ, sindicalistas ocuparam quase a metade dos 22 mil postos de confiança mais cobiçados do governo passado, com salários altos e sem concurso público.
Sindicalistas ligados ao governo comandam ainda algumas das maiores empresas do país, sentam-se nos conselhos de administração de muitas outras e dirigem os maiores fundos de investimentos brasileiros (Previ, Funcef e Petros).
Empresários são mais eficazes na gestão de empresas do que sindicalistas, mas todo esse acesso, político e econômico, no mínimo serviu para moderá-los e incluí-los no consenso seminal consolidado no governo Lula em torno da economia de mercado.
Vicentinho e companheiros, que sempre lutaram pela valorização do salário mínimo (fundamental para expandir o mercado interno e distribuir renda, como vimos no governo Lula), aderiram ao anunciado aperto fiscal ortodoxo do Palácio do Planalto.
O argumento usado pelo neo-ortodoxo ministro da Fazenda, Guido Mantega, para segurar o salário mínimo foi a incapacidade de o Estado arcar com o custo do aumento num momento de prometida austeridade fiscal.
Já a combalida oposição lembrou o antigo PT na oposição e apresentou projeto irracional que levava o mínimo a R$ 600 mesmo diante do perigoso repique inflacionário e das restrições orçamentárias.
A vitória dos estrategistas do Palácio do Planalto, que seguraram nomeações importantes no segundo escalão do governo até a votação da matéria no Congresso, pode animar os mercados hoje, pois sinaliza compromisso do governo com a austeridade.
É também prova de habilidade política de Dilma e seu time nesse começo de mandato.
A gestora, sem falar muito, pode dizer que entregou resultado.
Sérgio Malbergier
Sérgio Malbergier é jornalista. Foi editor dos cadernos Dinheiro (2004-2010) e Mundo (2000-2004), correspondente em Londres (1994) e enviado especial da Folha a países como Iraque, Israel e Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, "A Árvore" (1986) e "Carô no Inferno" (1987). Escreve para a Folha.com às quintas.

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